A chegada do patinho feio – ou belo, conforme os olhos de quem o olhava – foi o maior acontecimento do ano. A pequena comunidade, que normalmente se entretém a discutir as ninharias da vida rural, parou por completo naquele dia. E que dia! Chovia como se o céu tivesse decidido lavar todas as nossas pecadilhas. Ainda assim, ninguém ousou ficar em casa. Afinal, quando é que se vê um patinho feio a ser recebido com pompa e circunstância?
A fama do patinho precedia-o. Diziam uns, que era a criatura mais feia que alguma vez se tinha visto. “Uma aberração da natureza!”, exclamava Dona Etelvina, a eterna entusiasta das tragédias alheias. Outros, no entanto, insistiam que havia uma beleza exótica naquele ser. “Um charme indomável, como uma pintura modernista que só alguns conseguem apreciar”, opinava o Senhor Baltazar, com o ar de quem se acha mais culto que o resto do mundo. No fundo, a verdade é que todos queriam ver o patinho. Feio ou bonito, não importa – era a novidade.
No dia marcado para a chegada, a aldeia vestiu-se de gala. Ou, pelo menos, tentou. Havia bandeirinhas coloridas, mesas de madeira cobertas com toalhas aos quadrados e até um palco improvisado para os discursos. Tudo isso sob uma chuva incessante que transformava o terreiro num verdadeiro campo de batalha de lama. Mas quem se importava? Estávamos ali para testemunhar algo grandioso. Ou, pelo menos, era o que nos fazíamos acreditar.
O patinho chegou, finalmente, carregado numa pequena gaiola dourada que contrastava com o seu aspecto peculiar. Quando a porta se abriu, houve um silêncio tão profundo que até a chuva parecia ter parado por um instante. Ele saiu com passos curtos, como se soubesse que todos os olhos estavam nele. “Tão feio que chega a ser adorável”, murmurou Dona Gertrudes, a poetisa fracassada da aldeia, num tom que parecia misturar admiração e pena.
É curioso como, em questões de beleza, a opinião se molda às circunstâncias. Para uns, o patinho era a confirmação de que a natureza tem um estranho sentido de humor. Para outros, era a prova viva de que a beleza está nos olhos de quem a vê. E, no meio disso tudo, o patinho não parecia muito preocupado. Apenas sacudiu a chuva das penas e começou a bicar o chão, alheio à discussão existencial que provocava.
“No fundo, somos todos patinhos feios para alguém”, disse o padre da aldeia no discurso que encerrou o evento. As palavras ficaram no ar, acompanhadas por um músico local a tocar uma melodia melancólica no acordeão. Alguém soltou um soluço na multidão. Talvez fosse pela chuva. Talvez fosse pelo patinho. Ou, quem sabe, pela constatação de que, afinal, até as imperfeições têm o seu lugar de honra no mundo.
E assim terminou o dia em que o patinho feio chegou. A aldeia voltou à sua rotina, mas algo tinha mudado. Nem todos admitiriam, é claro. Mas, no fundo, cada um de nós levou um pouco do patinho feio para casa – aquela mistura de estranheza e beleza que nos faz lembrar que ser diferente também é uma forma de ser especial.